segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Começando com um mea culpa, infelizmente eu sou responsável por boa parte dessa merda toda. Na década de 90 eu tinha website e fanzine digital, ajudei a criar a cultura brasileira na internet. No começo do século eu trabalhava criando dispositivos de inclusão digital, e depois eu fui desenvolvedor do Orkut, a rede social que ensinou os brasileiros a usar a internet.
Eu fiz tudo isso na inocência, achava de verdade que a internet iria trazer mais informação a todos, e que isso melhoraria o mundo. Hoje vejo que fui ingênuo, subestimei o papel da falsa informação e de como a internet permitiu a manipulação de massa de um jeito muito mais eficiente.
Mas se me permitem, eu acho que sei onde a coisa deu errado e tenho uma sugestão para melhorar. Eu acho que o foco do problema é o *broadcast privado*.
Broadcast nunca fui problema na internet. As pessoas mandavam mensagens em lista de discussão, postavam em comunidade do orkut, e nesses meios o fake news nunca teve esse poder que tem hoje.
O que mudou é que hoje em dia você pode fazer broadcast para grupos fechados (tipo o zap da família). Isso foi o game changer. Quando você postava na lista de discussão ou na comunidade do orkut, você estava aberto à contestação, se você posta X, alguém sempre pode postar não-X logo abaixo. Em termos de evidência acumulada, as coisas se cancelam.
Mas o zap da família é diferente porque é uma rede de contatos confiáveis. Você confia nos seus parentes. Quando chega uma mensagem nesse grupo, você tende a confiar por default na mensagem porque você confia em quem mandou, e essa confiança no emissor transfere para a mensagem.
Aí você forma uma rede de confiança. Não importa que o emissor original seja um bandido na cadeia, escrevendo de um celular que entrou na cela enfiado no cu. Se a mensagem dele passar de grupo em grupo, ela vai ganhando confiança ao longo do trajeto, porque cada broadcast privado aumenta a confiança dela. A confiança vem do caminho, não do conteúdo.
A solução fácil para isso seria banir broadcast privado. Não pode mais ter grupo de zap, ou pelo menos não pode ter botão de share para grupo privado: se você quiser repassar, vai ter que reescrever. Aumentando a fricção no processo de share, a mensagem falsa tem mais dificuldade de propagar.
Outra solução seria fazer tracking da confiança da mensagem. Eu não faço idéia de como implementar isso, mas cada mensagem teria que ter um score que medisse a confiança da origem. Uma mensagem que transitou inalterada de uma fonte primária teria score alto, uma mensagem enviada por celular tirado do cu teria score baixo.
Mas eu não sei se nenhuma dessas alternativas é economicamente viável, dado que os times que implementam esses apps medem sucesso baseado em quantidade de shares. Se alguém tiver uma idéia melhor para atacar o problema eu agradeço.